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A situação social, política e econômica no estado do Espírito Santo modificou drasticamente depois do início da ação dos familiares da Polícia Militar proibindo-os policiais de saírem dos quartéis. Com um efeito cascata atingindo diferentes camadas sociais, a sociedade viu, horrorizada, uma onda de crimes que forçou a todos a se encarcerarem em suas casas por conta da insegurança. A Teoria das Janelas Quebradas parece auxiliar a pensar a respeito. Algumas reportagens auxiliam a ter uma ideia do contexto: Espírito Santo: Retrato de tragédia anunciada; Com a palavra, as mulheres que pararam a PM do Espírito Santo; Direto do Espírito Santo: Últimas informações e entrevistas com moradores sobre a onda de violência; Sem policiamento, Espírito Santo registra mais de 50 mortes em três dias.

Pensando nesse contexto, escrevemos um texto visando recolocar os pontos a respeito da posição de cada um em sua vida e em função do que estamos vivenciando. O texto o mal-estar provocado pelo contexto como móbil de uma reflexão existencial e humana. É necessário, contudo, considerar a importância de compreendermos melhor os fatores políticos, econômicos e sociais envolvidos nessa crise de segurança e participar desse processo, o que nos inspira a situar a pintura de Antonio Berni como representando esse texto.

Reflexão sobre o contexto do Espírito Santo:
“A vida é tão rara”

Desde o último fim de semana vivemos uma situação bastante ruim no estado do Espírito Santo. A insegurança, a preocupação e o medo atingem-nos a todos, pois o mal foi distribuído socialmente – talvez seja o único elemento bem distribuído em nossa sociedade atualmente. Mais de cem pessoas foram mortas; comércios foram saqueados; as ruas ainda estão vazias; faltam trabalho, estudo, saúde, lazer e dinheiro; falta segurança; o mal-estar nos irrita e preocupa com as consequências, como as perdas, as contas, os impostos.

Vivemos uma triste realidade e sentimos o gosto amargo que muitos sentem cotidianamente. Temos agora uma ideia básica do sofrimento de quem vive em contextos de conflito permanente. Embora cogitemos formas de vencer o mal, nenhuma é absoluta, todas são relativas e precisam ser articuladas. Enquanto isso não acontece, continuamos em cárcere. Entretanto, não seria este um momento ímpar em nossas vidas?

Diante de situações difíceis como esta, quando a esperança parece desaparecer, podemos retirar uma pergunta dos escombros de nossos sentimentos e nos fazê-la de cabeça erguida: “Qual é o sentido da vida?”. Seria trabalhar? Estudar? Casar, talvez? Pagar as contas em dia? Andar na praia? Cuidar dos filhos? Viajar pelo mundo? Estar com a família? Festejar? Afinal, qual resposta encerraria uma pergunta tão complexa? Importando menos a resposta, essa pergunta nos remete à contemplação da vida naquilo que ela tem de mais essencial: sua raridade.

Entenda, não estou diminuindo o peso do que está acontecendo, mas apresentando outra perspectiva. Ainda é preciso ter cuidado e cautela, proteger-se em casa, sair somente em situações de extrema necessidade e com companhia, evitar publicar fanatismos e inflamar os afetos. Assim que essa situação se encerrar, na medida do possível, nós lutaremos para reerguer o que foi destruído – somos potentes para isso. Agora, contudo, é importante revermos as prioridades aproveitando o contexto estranhamente propício.

Nossa rotina foi quebrada e, apesar da horrível situação, podemos nos permitir a chance de avaliar nossa perspectiva diante do sentido que damos à vida. Duas coisas são certas: O que nos faz humanos é a possibilidade que temos de contemplar a raridade da vida até nos momentos mais difíceis; O que nos faz humanos é a capacidade que temos de suportar as situações mais danosas e aproveitarmos delas para dar um salto em nossas vidas e na humanidade. Não seria este um momento único para isso?

Aproveite para pensar a respeito. O que nos torna vivos ou humanos é menos o emprego, a escola, o hospital, a rua e bem mais nossa capacidade de transformar o que tocamos, e transformar é mudar a forma como algo se manifesta no mundo. Faço aqui um convite a esse cuidado especial com a vida de cada um e de todos nós.

Diante do que está acontecendo, então, “um pouco mais de paciência”. Até mais!

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