Qual a(s) diferença(s) entre a prática psicológica (psicoterapia) e as práticas dos demais profissionais de saúde? Você já parou para pensar nisso?
Geralmente buscamos um profissional de saúde pensando nas possíveis situações: evitar o aparecimento de alguma doença, tratar uma doença instalada, reabilitar-se das sequelas produzidas durante o tratamento de uma doença, promover saúde e qualidade de vida, estética em geral [Se você tiver outras situações, relate que serão acrescentadas]
Temos então uma escala que vai do ato de evitar uma doença, passando pelo seu tratamento, pela melhoria da condição pós-doença, por práticas de qualidade de vida e aspectos estéticos. Entenda aí uma gradiente, tal como as cores de um arco-íris.
Dificilmente um profissional de saúde não terá sua prática localizada nessa gradiente, e quando se fala profissional de saúde aqui, remete-se e a profissionais como fisioterapeutas, fonoaudiólogos, médicos, nutricionistas, odontólogos, psicólogos, terapeutas ocupacionais etc. Eventualmente, o foco do trabalho será maior ou menor numa parte dessa grade, assim como poderá haver profissão que não faça uma dessas ações, mas no geral é possível localizar os pontos com um pequeno esforço.
De maneira resumida, praticamente todo profissional de saúde que trabalhe com terapêutica fará o caminho:
1) prevenção de doenças, 2) tratamento, 3) reabilitação, 4) promoção da saúde, 5) estética e afins
Considerando isso, peguemos o que cada profissional citado faz e vejamos o que se fala a respeito. Pode ser que você esteja se perguntando qual a razão disso, contudo, já é possível aliviar essa dúvida adiantando a orientação e a questão desse texto:
Em primeiro lugar, esse texto não visa necessariamente aos interessados em se graduar em psicologia, mas aos interessados em serem tratados por um psicólogo, ou seja, a quem está buscando tratamento e tem dúvidas a respeito;
Em segundo lugar, a questão do texto é o fato de que buscar um fisioterapeuta, fonoaudiólogo, médico, nutricionista, odontólogo, terapeuta ocupacional, em alguns casos, parece ser menos difícil que buscar tratamento psicológico, e isso exige uma reflexão.
A seguir estão algumas informações das profissões citadas, encontradas no Guia do Estudante, da Editora Abril. Esse é um material simples, de fácil acesso e compreensão. [Pois é, não era para quem quer se graduar, mas a informação é do Guia do Estudante. Fazer o que :)].
Algumas profissões que realizam terapêuticas
– Fisioterapeuta: O Fisioterapeuta trata e previne doenças e lesões, empregando técnicas como massagens e ginástica. Este profissional diagnostica e trata problemas causados por má-formação, acidentes ou vícios de postura. As massagens e a ginástica têm a finalidade de restaurar, desenvolver e manter a capacidade física e funcional do paciente. Também faz tratamentos à base de água, calor, frio e aparelhos. Além de ajudar na recuperação de acidentados e portadores de distúrbios neurológicos […].
– Fonoaudiologia: É a ciência que se ocupa da prevenção, da habilitação e reabilitação da voz, da audição, da motricidade oral, da leitura e da escrita. O fonoaudiólogo trata de deficiências de fala, audição, voz, escrita ou leitura.
MedicinaO Médico investiga a natureza e as causas das doenças humanas, procurando sua cura e prevenção. A saúde humana é o objeto de estudo do médico. Ele pesquisa, previne e trata disfunções e moléstias. Para isso, é imprescindível que ele esteja sempre bem-informado e atualizado a respeito de novas drogas, técnicas e tecnologias. Faz diagnósticos, pede exames, prescreve medicamentos e realiza cirurgias.
– Nutrição: O Nutricionista investiga e controla a relação do homem com o alimento para preservar sua saúde. Ele planeja, administra e coordena programas de alimentação e nutrição […]. Define cardápios, sugerindo pratos variados e equilibrados, que supram as necessidades nutricionais dos clientes, pacientes ou hóspedes. Orienta e prescreve dietas individuais ou de grupo, para diabéticos, hipertensos, obesos e pacientes de doenças renais, hepáticas ou qualquer outra cujo tratamento exija acompanhamento alimentar específico.
– Odontologia: Este bacharel se dedica ao estudo e ao tratamento dos dentes, da boca e dos ossos da face. Ele cuida da saúde e da estética bucal. restaura, extrai e limpa dentes, projeta e instala próteses, realiza cirurgias e trata doenças da gengiva, da bochecha e da língua.
– Psicologia: O Psicólogo estuda os fenômenos psíquicos e de comportamento do ser humano por intermédio da análise de suas emoções, suas ideias e seus valores. Ele diagnostica, previne e trata doenças mentais, distúrbios emocionais e de personalidade. Ele observa e analisa as atitudes, os sentimentos e os mecanismos mentais do paciente e procura ajudá-lo a identificar as causas dos problemas e a rever comportamentos inadequados.
– Terapeuta Ocupacional: O terapeuta ocupacional estuda e emprega atividades de trabalho e lazer no tratamento de distúrbios físicos ou mentais e de desajustes emocionais e sociais. O profissional utiliza tecnologias e atividades diversas para promover a autonomia de indivíduos com dificuldade de integrar-se à vida social em razão de problemas físicos, mentais ou emocionais. ele elabora planos de reabilitação e adaptação, buscando não apenas desenvolver no paciente autoconfiança, como também orientá-lo quanto a seus direitos de cidadão.
Colocadas em sequência, você notou alguma diferença entre a psicologia e as demais profissões? O fisioterapeuta trabalha com o corpo, o fonoaudiólogo com a voz/audição, o médico com as doenças, o nutricionista com a relação pessoa-alimentos, o odontologista com os dentes [inclusive, o termo dentista não é injusto], o terapeuta ocupacional com os aspectos físicos e emocionais, e o psicólogo com as doenças mentais, as emoções, os ideais e os valores.
Olhando assim não parece haver problema, mas é aí que se escondem grandes dificuldades para alguém buscar o serviço de psicologia devido a diferença de sua prática em relação às demais.
Em todos os outros casos, embora os profissionais trabalhem com você, eles tratam aquilo que não diz respeito a você enquanto pessoa subjetiva, mas a você enquanto pessoa objetiva [com suas devidas exceções, pois todos precisam saber quem você é, como você vive, o que você faz, o que você pensa, mas não necessariamente tratam dessas mesmas questões – essa generalização serve à condução do texto, mas não é completamente verdadeira].
Seu corpo, sua voz/audição, suas doenças, seus alimentos, seus dentes, seu físico/emocional são todos componentes seus, os quais você pode tratar. Mas existe uma diferença entre tratar esses componentes e tratar seus ideias e seus valores, suas emoções tomadas não pelo ponto de vista físico, mas pelo ponto de vista psíquico.
Temos aí a diferença:
Uma coisa é ter problemas nos dentes, com a alimentação, com a voz/audição, nas articulações, uma infecção no nosso corpo. Existem tantos motivos para ter problemas nesses componentes de nossa vida. Outra coisa, contudo, é ter problemas em nosso psiquismo, em nossa mente. Nesse caso há uma questão diferente, pois a mente não é exatamente um componente seu, mas é “você mesma(o)”, é o seu “em si”, seu “eu interior”, seu “self”, sua “consciência”, seu “inconsciente”, seu “eu sou eu mesmo e pronto” e vários outros nomes que as pessoas colocam [e que não necessariamente são utilizados nos trabalhos de psicólogos e psicanalistas].
Encontrar uma dificuldade em si mesma(o) é algo tão fácil e corriqueiro quanto achar areia na praia. Entretanto, esse é um fato visto por muitas pessoas como um atestado de desequilíbrio, loucura, perturbação, histeria, perturbação, descontrole, insanidade etc. Pior ainda, é a confirmação dura e inverídica de que esses esses termos são pejorativos graves: eles mostram simplesmente que não existe um equilíbrio emocional que seja verdadeiro, comum e correto – mesmo que a sociedade nos exija isso, te exija isso. [Mas quem é a sociedade se não nós mesmos com os outros?]
Por outro lado, o que seria “encontrar um problema na mente”? É possível encontrar na mente problemas equivalentes aos encontrados por outros profissionais em suas práticas? A terapêutica é igual?
Mesmo que a terapêutica de profissões como fisioterapia, fonoaudiologia e nutrição precisem de sua participação no processo, você participa como aquela(e) que realiza o que é pedido ou que recebe a ação do profissional, para conseguir chegar ao que é almejado.
Você pode ou não seguir o que está sendo colocado, pode ou não deixar o profissional intervir, poderá inclusive se sentir desconfortável, se incomodar com a proposta ou com a pessoa que te propõe, e isso pode vir a te perturbar nos pontos mais específicos de sua intimidade, na forma de lidar consigo mesma(o), mas esses profissionais não tratarão desse aspecto, nem de sua intimidade, nem do “lidar consigo mesma(o)” [expressão utilizada na mesma acepção de “eu interior”, p.ex]. Nesses casos, se você não quiser, acabou e pronto.
Agora, quando se trata de aspectos mentais, considerando emoções, ideais e valores, o “lidar consigo mesma(o)”, esse “eu interior”, “minha intimidade mesmo”, é exatamente o ponto em que o psicólogo vai tocar, melhor! precisa tratar. Você não mexerá nos componentes de sua vida somente, mas naquilo que dirige esses componentes, naquilo que decide, que vivencia e experimenta essas vivências.
Entende como a situação muda?
Todo profissional que trabalha com terapêutica sabe que se o paciente não quiser, ele não fará o tratamento e que se o paciente modifica sua disposição em relação aos problemas que vive, ele terá mais condições de lidar com eles e seguir adiante. Mesmo sabendo disso, nenhum profissional realmente trabalha com essa “disposição em relação aos problemas”, a não ser o profissional de psicologia.
Talvez aí tenhamos dificuldades em procurar ajuda com um psicólogo. Provavelmente seja isso o que você passa. Afinal, quando você procura ajuda de um, você está ciente de que ele tratará não de um componente seu, mas de você mesma(o) e de suas questões interiores. [Uso o termo “questões interiores” em um sentido comum, pois não é um termo técnico da profissão].
A diferença entre a prática provoca duas dificuldades
1º dificuldade: Muita gente acha que procurar ajuda de um psicólogo por ter dificuldades de lidar consigo mesma é algo pejorativo e um atestado de fraqueza;
2ª dificuldade: Muita gente tem medo de lidar com suas próprias questões, acreditando que isso pode ser difícil ou impossível, ou ainda, que não precisa de ajudar e pode resolver sozinha(o).
Seria tão mais fácil se o psicólogo passasse um remedinho, não? Ou se chegasse ali, falasse algo e pimba!, você mudou completamente. Ou mesmo, se ele fizesse uma massagem na sua cabeça e você notasse uma liberdade maior na vida.
Ah, como seria fácil! Mas não é, pelo simples fato de que você não é um componente seu, como são sua voz, sua alimentação, seus dentes, seu corpo etc. Então precisamos de seu envolvimento porque sem ele, nada acontece.
Se utilizarmos a velha metáfora da pessoa-carro, diríamos que cada profissional trata de uma de suas partes: lataria, motor, combustível, lanternagem, rodas etc. O psicólogo trata do condutor do veículo. Simples assim.
De que adianta um carro perfeito com um condutor preocupado?
Haverá acidentes, na certa!
De qualquer forma, é uma decisão do condutor procurar ajuda para si ou para o carro – e ainda há tantos condutores que exageram no cuidado ao carro que, quem o vê, se dá conta de que o doente mesmo é ele, o condutor, e não o veículo. Ao menos já tem acontecido de cada vez mais as pessoas se darem conta de que quem procura psicólogo busca por quer e precisa de ajuda profissional, seja lá qual nome tiver, e jogue-se para lá qualquer termo pejorativo. Melhor procurar ajuda que sofrer calada(o). Mas se o seu problema for o preço da consulta, que são outros quinhentos, pergunte-se quanto você gasta com coisas do dia-a-dia, muitas das quais supérfluas, pergunte-se o quanto você gasta com tratamentos que você acha que estão resolvendo seu sofrimento mas estão nos componentes, sem tocar no condutor. São escolhas… Entretanto, nem toda escolha produz um efeito tão interessante quanto outras. Veja as que você realizará.
Gostou da metáfora da pessoa-carro? Que profissional de saúde você busca quando:
quebra o freio de mão? cai jamelão no capô? acende o farol dianteiro e nem nota? pode recuar para evitar um acidente mas fica paralisada(o)? estaciona em local proibido? entra com tudo na rua sem ver que tinha gente circulando? quer acelerar mas se contém? fica com vergonha de mostrar o carrango por aí? é chamada(o) para um racha na rua? é confundida(o) com outra pessoa na direção? sofre uma raspada de leve por alguém com pressa? o óleo do motor vaza? o vidro fica embaçado? enfim, quando perde a direção?