Clicky

– Olá! (Cumprimentam-se) Como vai? Por favor, entre!
(Sentando-se) – Não sei o que vim fazer aqui.
– Pois é, o que veio fazer aqui?
– Não gosto de psicólogos. Você vai na pessoa pra ela ficar te dizendo o que você tem que fazer, como se soubesse o que você tá passando. Não sabe de nada.
– É mesmo?
– E não é o que! Onde já se viu, uma pessoa que manda você fazer alguma coisa sem nem considerar o que você está vivendo! Pfff, não gosto mesmo!
– Do que mais não gosta?

– Ah, esse negócio de ficar lendo a mente, analisando tudo o que a gente faz.
(Gargalhando) – Você acredita nisso?
– Ah, e não é?
(Expressivo) – Como vou saber?
(Riso contido) – Hum. Tá. Só não acho que falar dos meus problemas para alguém me ajudará a mudar alguma coisa. Desde quando falar dos seus problemas faz eles mudarem?

– Desde nunca,…
– Então, tá ven…
– … enquanto você não arriscar falar para saber se realmente faz alguma mudança.
(Cruza os braços) – Não acredito que faça!
– Não acredito que faça, o que?
– Alguma diferença.
(Interessado) – Como assim?
– É simples, ué, você deveria saber. Os problemas são os problemas, o que eu falo é o que eu falo. Não tem relação alguma entre uma coisa e outra.
– Por exemplo?
– Por exemplo, eu estou passando por uma dificuldade em casa. Meu filho não me respeita, ele simplesmente me ignora. Eu tento ser duro com ele, sou firme, bato quando ele não me obedece, ponho ele de castigo, mas nada adianta.
– Ele sempre foi assim?
(Descruza os braços) – Não. Quando criança, ele era o menino mais educado e respeitador possível. Eu mal abria a boca e ele já se aproximava, querendo saber o que eu ia falar.
– Bem diferente de como está hoje.
– Bastante! Eu não entendo o que aconteceu. Ele sempre foi adorável e de repente ficou rude, grosseiro, não quer estudar, não obedece a ninguém.
– Não obedece a ninguém?
– Não, na verdade, ele obedece ao meu irmão.
– Ao seu irmão?
(Surpreso) – Engraçado, ele não era assim com ele.
– Ele, quem?
– Meu filho não era assim com meu irmão. Era mais na dele. De repente, inverteu. (Suspira) (Deprime-se) Ele não me obedece e joga na minha cara que quer ser como meu irmão: esperto, brincalhão, bem de vida, bom pai. Isso me mata!
(Enfático e Irônico) – Era mais na dele ou na sua?
(Ri) – Na minha! (Firme)
– Qual é o incômodo?
– É que me sinto o pior pai do mundo porque meu filho não me ama mais. (Choro)
(Acolhedor) – Tente falar disso, sobre se sentir o pior pai do mundo.
(Defensivo) – Lá vem você pedindo pra eu falar.
– Você já começou a falar. Continue.
– Está bem. É muito ruim um filho achar o pai um mau pai. É ruim demais! Parece que a nossa função perde o valor, que tudo o que você pensava de você mesmo dissolve no ar. Eu nunca pensei que um filho meu pudesse dizer isso.
– Parece que a função perde o valor?
– É! O que é um pai sem um filho? É só um homem. Então o homem se casa com sua mulher, ela engravida e tem um filho dele, e nesse momento ele vira pai. Não tem como ser pai antes de ter tido um filho, só se for tio.
– Um pai ou um tio.
– Meu irmão parece mais pai que eu. Mais paizão, mais amigo, mais companheiro. Eu nem de longe estou conseguindo isso. Meu filho não me respeita, eu não sirvo pra ser pai. Se eu conseguisse ser igual a ele.
– Ser igual a ele, quem?
– Meu pai!
– (Silêncio)
– Meu irmão é igual ao meu pai!
– E você?
(Perturbado) – Eu? Sou igual a ninguém! (choro)
(Acolhedor e bem humorado) – É um bom começo.
(Parando de chorar e limpando as lágrimas) – Como assim?
– É a chance de construir algo novo na relação com o seu filho, não como seu pai, mas do seu jeito junto a ele.
– Eu não consigo! Isso não vai resolver nunca!
– Você também não acredita nisso?
– Não!
(Irreverente) – Ah, você não acredita em muitas coisas, mas já está falando e começando a pensar nos problemas, mesmo sem acreditar.
(Surpreso e Pensativo) – É verdade.
(Levantando-se) – Então volte na próxima vez para continuarmos.
– Mas já acabou?
– Só está começando!

Na saída:
(Abrindo a porta para sair) – É, até que psicólogo não é tão ruim assim não.
– Foi você quem disse!
– (Gargalha) (Sai e fecha a porta, lentamente).

Abraço!

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